sábado, 4 de janeiro de 2020

O DESMANCHE DO NINHO

Uma vez ouvi uma história sobre a águia e seus filhotes. Tendo chegado a hora, a águia, que faz ninho sempre no alto de penhascos, leva seus filhotes até a borda e dá um "empurrão", obrigando-os a usarem as asas, até então sem função. Esse empurrão os leva para a liberdade, para a próxima fase da vida, tornando-os senhores do céu.

Quando ouvi esta história fiquei me perguntando sobre o ninho. Ele é abandonado? Deixado lá, sem função? Ocupando um espaço onde poderia ser criado outro ninho? 

Não seria melhor se a águia fosse, graveto por graveto, folha por folha, destruindo o ninho? Isso não levaria os filhotes a terem que se virar sozinhos?

Talvez! Mas cheguei a conclusão que seria perverso por parte da águia se ela fizesse isso. Ela não estaria dando uma direção, não estaria orientando os filhotes. Estaria, sim, desamparando-os, sem que eles entendessem qual o significado daquilo.

É como a Sindrome do Sapo Fervido. Colocado na água fria e deixando a água aquecer o sapo morre fervido porque vai se acostumando com a temperatura da água. Mas jogue o sapo numa água fervente e verá ele saltar de lá imediatamente.

O que eu quero dizer com isso? Às vezes nos acostumamos com uma situação. Até a procuramos. Ela é nossa meta. Mas, uma vez lá, não notamos as alterações que acontecem. Ainda achamos que estamos no lugar que sempre buscamos, mas ele já mudou. Com pequenas alterações, até provocadas por nós mesmos, por nossa interação, o que era um objetivo deixa de ser. O que era para ser bom deixa de ser. O que era para ser o ponto final se mostra como apenas mais uma etapa.

Hora de pular no vazio, bater as asas que já tinhamos esquecido para que serviam e alçar vôo. Olhar para o penhasco e se despedir do ninho, agradecidos pela acolhida de algum tempo.

Mirar novos desafios, se alimentar de esperança e voar.

Não é para ser bom ou ruim. Não é para ser certo ou errado. 
É apenas a vida, seguindo seu curso.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

A CIDADE DESERTA

Diferente das cidades do interior, minha cidade é movimentada. Como toda Capital, um caos. 
A gente se acostuma. Os ruídos da cidade entram em nós e passamos a não mais ouvi-los. Os barulhos são pedaços da cidade. 
Por isso mesmo é que no Natal e Ano Novo a cidade me assusta. Não pelos barulhos. Pelo silêncio.
A cidade para, as ruas ficam desertas. Todos, unidos, em família, estão na expectativa da comemoração.

O que eu faço nessas datas? Eu rezo, eu choro, eu me defino.

Essa época do ano, há muitos anos, tem sido uma data triste.

Eu ainda não consegui achar uma fórmula para viver a sua plenitude. Eu sei que deveria ser grato por estar vivo, por ter saúde, por ter família e amigos, mas algo em mim não funciona assim.


Sim, sou grato. Não só no Natal, mas em todos os dias do ano. Sou grato por estar vivo, por ter saúde, pelos meus amigos e por ter uma linda família. Mas, no Natal? É diferente.


No Natal eu sinto falta. A falta daqueles que se foram. Sinto a ausência, o vazio. Sinto como se todos os demais dias fossem dos outros, para que esses dias, o Natal e o Ano Novo, sejam meus. Não meus, mas dos Meus Ausentes.


Eles olham para mim e me vêem como ninguém vê. Eles me conhecem mais porque estão dentro de mim. Para eles, não há segredo. Eles sabem quem sou, o que sou, o que penso.

Nessas datas eles se manifestam e conversamos. Conversamos sobre quem sou e o que ando fazendo. Sobre o que fiz da vida nesse último ano. Sobre os planos que tenho para o futuro e se conseguirei empreendê-los sendo quem sou e fazendo o que faço.

Eles não são nada fáceis. Não me dão a minima chance de justificar um deslize ou outro. Não aceitam desculpas. Mas é assim que tem que ser, é assim que eles me podem ser humanamente úteis. 

E descubro, enfim, que o silêncio da cidade deserta também está dentro de mim.




terça-feira, 31 de dezembro de 2019

TUDO IGUAL

Este ano estou passando comigo mesmo. Nada de festas ou confraternizações . Nada de uma virada brusca, de mudanças radicais de calendário, hábitos ou promessas. Apenas o encontro com um outro novo dia. Com a gratidão de estar vivo e a certeza que não se evolui ou se constrói algo da noite para o dia. Isso vale para mim e para meu olhar para os outros.

Sempre quis olhar para o Outro e entendê-lo. Ainda estou tentando conseguir isso.

Entendê-lo quer dizer que ele não teve o pai que eu tive e que, portanto, não terá o foco e a determinação como objetivo de vida.

Ou teve a mãe da minha mulher, que a ensinou a ser  organizada, cuidar das coisas e planeja-las com antecipação.

O Outro é alguém que também está em construção. Alguém que olha para mim e ressente de eu não ter tido o pai que ele teve, ou uma mãe igual a sua. Que me acha mais desorganizado que seus irmãos e intolerante com certas coisas. Que não olha os meus acertos por absoluta falta de tempo; tomado que está em perceber os meus defeitos.

O que queremos? A ditadura de todos vivendo a minha vida, fazendo as minhas escolhas e ouvindo as minhas músicas? Queremos um jardim de margaridas, sem chance para as rosas, cravos e hortencias ? 

Seria tudo muito pobre. E eu mais pobre ainda por querer que os outros sejam iguais a mim. Sem nada para me ensinar, assustar ou surpreender. 

Um mundo sem sustos ou exclamações? Esse sim, seria um mundo horrível. 

segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

SUA VERDADE


Não, não entendo porque é assim, mas é.
Ninguém pode compreender sua reação a determinadas provocações porque não têm a sua história.

Para algumas pessoas palavras podem ser ditas como quem pensa em voz alta. Depois, retiram o que disseram e, num passe de mágica, tudo volta ao que era antes.

Sinto dizer, não é bem assim. 

Palavras têm vida. No momento em que são ditas, começam a criar sua própria realidade.

Tudo bem pensar. 

Enquanto pensamento, aquela verdade é sua, só sua. Nem chamamos de Verdade; chamamos de Reflexão. É algo que você ainda está elaborando. Pode se transformar em Sua Verdade ou não. Sua consciência dirá se ela deve ser manifesta, guardada só para você ou descartada. 

Mas uma vez dita, ela é do mundo. Ela tanto pode ferir alguém como expor quem você é, o que pensa realmente, qual a sua verdade.

Perdoamos a nós mesmos por nossas verdades escondidas, por nossas reflexões, por nosso modo de ser. Sabemos quem somos e de onde viemos. Temos uma infinita pilha de justificativas para nos explicar. Mas pedir aos outros que desculpem nossos atos falhos, nossas verdades imaturamente antecipadas ao mundo, é querer demais.

Não finja que não disse, não diga que foi mal interpretado. Apenas cuide para elaborar, com calma e paciência, o que espera que o mundo pense de você. Depois, só depois, expresse sua verdade.

sábado, 28 de dezembro de 2019

DA SOLIDÃO

A solidão me atrai.
Se gosto dela? Não sei. Já tive mais certeza de que não gostava. Hoje? Realmente não sei.

A solidão é como uma mãe. Nunca me pediu nada em troca. Quando retornava, depois de mudar de cidade ou fechar um relacionamento, ela estava lá, à minha espera. Não me perguntava onde fui nem o que fui fazer. Não dizia bem-feito ou bem-vindo. Apenas me recebia, quieta, calma, imune aos acontecimentos.

Já pensei na  solidão como mais um dos ingredientes do desamparo. Além dela, o medo e a ansiedade. Mas retirei a solidão da receita. Com o tempo, seu sabor deixou de ser tão amargo e não combinava com a força dos demais. 

Desamparo não é uma condição daqueles que sempre foram sozinhos.   Desamparo é quando lhe tiram o chão, quando lhe cortam os laços. Quando você tinha algo valioso e deixou de ter. Os desamparados foram felizes algum dia. Tinham relacionamentos duradouros. Acreditavam que tudo era para sempre. Um desamparado passou mais tempo no amor do que na solidão.

Voltemos à Solidão. 

Não saber amar é motivo para a solidão. Não reconhecer o amor também; embora se tenha a desculpa de dizer que esperava que o amor fosse outra coisa. Como vou saber, se nunca amei? pergunta o solitário indignado.

Achei que o amor fosse a construção de duas pessoas. Que não ia valer o conceito de cada um, mas sim a experimentação de cada um. Achei que o amor seria um conceito construído a cada relação porque deveria depender das experiências de cada um, não acham?

Eu só posso amar a partir do que eu sou, do que eu tenho de vida dentro de mim. Então o amor é único em cada relação. E só pode existir quando a vida de cada um foi entregue ao outro.

O que tem de lindo, tem de complexo. O que tem de simples, tem de intenso. 

O Amor é muitas coisas. A Solidão é só Solidão.

domingo, 15 de dezembro de 2019

ENTRE DOIS MUNDOS

Tudo bem, eu sei, não é fácil atravessar uma ponte de cordas.
Você não pode controlar a instabilidade que vem do balanço das cordas, nem querer que ele pare. 

É inerente às conexões ligarem elementos diferentes. Se fossem iguais, não haveria necessidade de conexão, não é mesmo?

Existem conexões fáceis, feitas por pontes metálicas ou de concreto. Outras, não tão fáceis - e com o risco de não serem tão duradouras - são feitas por pontes de madeira, que requerem uma manutenção de tempos em tempos. E existem as pontes de corda. 

Ah! As pontes de corda. Instáveis, arriscadas, muitas das vezes ligando dois mundos muito diferentes. Você não pode querer controlar a ponte. Você precisa se adaptar à ela.  E ir caminhando, um passo de cada vez, ora parando, ora andando mais rápido. Tudo dependendo do balanço da ponte.

É preciso ser sábio para se atravessar uma ponte de cordas.  Quem consegue, consegue. Ótimo. Quem não consegue, fica do lado de cá, olhando a paisagem. 

Mas ninguém, ninguém, pode ficar por tempo indefinido no meio da ponte, achando que está unido aos dois mundos. Ou que está convivendo com eles. Não está. A verdade é que está, apenas, preso numa ponte de cordas, longe dos dois lados.

Se você não sabe atravessar uma ponte de cordas precisa escolher em qual mundo vai ficar. 

A ponte de cordas não é um objetivo em si mesma. Ela é apenas a motivação para lhe trazer a coragem, a confiança e a disposição que você precisa para conviver nos dois mundos.


terça-feira, 10 de dezembro de 2019

SOBRE OS POEMAS

Poemas escritos não são garantias. Eles se desfazem.
São eternidades de um só dia. 

Amanhã, nascem outros novos poemas, novas reflexões, novas formas de pensar.

Daí, então, começa uma nova eternidade de um só dia.

terça-feira, 5 de novembro de 2019

O DRAMA DO AMOR

Amores, já vi muitos. 

Passei por eles. 

Amores acontecem em lugares inesperados. 

Precisamos estar prontos para abraçá-lo ou confrontá-lo, a depender de quão profundo seja nosso desejo, nossa carência ou nossa crença.

Amores são eternos. Momentos são eternos. 

Apenas a eternidade não é eterna. Ela depende do desejo de guardar ou deixar ir. Da doce lembrança ou do amargo esquecimento. 

A eternidade, como tudo na vida, é uma fase do tempo.

sábado, 7 de setembro de 2019

APENAS

Quantas noites de estudo, 
quantas provas, redações, lembranças.

A pena deslizando no papel, trazendo sentimentos em palavras.

Quantas cartas de amor, quantas frases de saudade.

Quantos sonhos escritos no Diário, quantas confidências.

Aqui está ela, parceira silenciosa de inúmeros momentos.
Amiga, fluindo tinta, vivendo e traduzindo sua história.

Você, ausente. E ela aqui, em silêncio, calma e quieta, símbolo e testemunha de uma vida.


terça-feira, 23 de julho de 2019

MUDANÇAS




"A gente vive esperando que as coisas mudem, 
                                                              que as pessoas mudem.

Até que um dia a gente muda, 
                                          e vê que nada mais precisa mudar".

Autor Desconhecido



sexta-feira, 3 de maio de 2019

ESTAR ALI

Estar alí até que o dia termine, 
Até que a noite aconteça, 
Até que tudo se acabe, 
Até que nada mais floresça.
Estar ali,
até que o valor de estar ali se perca.

quarta-feira, 20 de março de 2019

REFLETINDO 2




Se sua casa não for o seu lar, Encontre-o.




quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

REFLETINDO





Nenhuma opinião é válida, se proferida por aqueles que se tornaram estranhos à casa.




sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

POR PURA DISTRAÇÃO

Sempre tive culpa por gastar o meu dinheiro.
No começo não era culpa, era pavor, medo dos grandes. 


Claro, era o orçamento apertado de um simples funcionário que acabava de se casar porque a filha já estava a caminho. Apartamento alugado, com cama, fogão e geladeira emprestados. Todo ano a imobiliária aumentava o aluguel num patamar acima das horas extras que eu fazia para cobrir o orçamento. Já me oferecia para trabalhos de procurar diferença, trabalhava aos sábados e domingos, até descobrir que dar aula particular dava mais grana. Mas o aluguel continuava aumentando e tivemos que buscar um bairro mais distante. 

Fomos para o Ipiranga, para dar conta do recado. A solução não foi satisfatória porque o mofo das paredes nos fez mudar de lá rapidinho. Como o deslocamento casa/trabalho aumentava o custo e o tempo, optamos por um  apto térreo no Bairro São Pedro, próximo ao trabalho, numa rua que dava acesso à favela. Por esta característica, o aluguel era aceitável. Lá as despesas acalmaram um pouco. Minha mãe ajudava no material escolar e conseguimos uma bolsa parcial para a escola dos meninos.

Depois veio a separação e, com ela, a pensão dos meninos. Já não podia controlar o orçamento de custos, e era demandado a todo momento para cobrir mais despesas. O emprego em BH já não supria a demanda. Tinha que achar uma solução para aumentar a receita, porque a despesa já não era eu quem controlava. 


Me arrisquei em Brasília. Mais estudo, mais cursos, em busca de melhores condições de trabalho. O salário aumentou, mas a síndrome do pai ausente me fazia sentir uma culpa enorme se não dedicasse meus recursos para eles. E as demandas continuavam além e acima da pensão, que já consumia 40% do bruto dos salários. Sobrava 60%, para ser dividido com todas as contribuições salariais, inclusive o Imposto de Renda. Já não tinha o sábado e o domingo para aumentar o orçamento. O trabalho no Banco consumia o sábado e no domingo eu não tinha forças para mais trabalho. Precisava descansar a cabeça e o corpo.

Depois os meninos cresceram, minha filha casou. Mantive a pensão do meu filho até ele terminar o doutorado, bem além dos seus 24 anos. 


Com a morte de minha mãe recebi uma pequena herança. Com o PDV da empresa, outro pouquinho mais. Formei poupança, até que enfim. 


Do pouco que sobrava em Brasilia consegui comprar uma casa, num condomínio distante. Ao vender a casa, transformei o dinheiro em dois apartamentos, um para cada filho. Afinal, não gostaria que eles passassem o sufoco de viver no aluguel. Aquela situação, dramática, não a queria para os meus filhos.


Hoje tenho uma pequena poupança e um salário de aposentadoria que busco me manter dentro dele. 

Com o que tenho dá para visitar o mundo, se souber planejar as viagens e ficar dentro do orçamento mensal.  Uma consultoria aqui e uma compra e venda acolá ajudam na geração de caixa.

Mas o mais dificil de tudo, acreditem, é tentar me ver livre da culpa de gastar dinheiro. Essa, me corroi o tempo todo. E quando não sou eu, a vida delega a função para outros, que não sabem da minha história, do meu passado. Que não sabem de onde venho e como cheguei até aqui.

Que se espelham não no que gastam, porque lhes é permitido, mas no que acham que eu deveria gastar, tomando posse da minha vida sem critério e sem remorso. Talvez, apenas, por pura distração.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

NADA MAIS

Nada mais importa. Nada mais.
As recordações?.... De cada um.
Cada qual remontará seus pedaços à sua maneira, com suas escolhas e seus segredos.
A história dos dois passa a ser a versão de cada um.
E na diferença entre elas, a soma de nossas impossibilidades.

 
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